RÉPLICA DA UNIÃO E PETIÇÕES DAS RÉS

RÉPLICA DA UNIÃO

5 de julho de 2021

(Parte 38) (Evento 98) (Pág. 1817)

Foi apresentada Réplica pela União, envolvendo questões preliminares e de mérito. Nas preliminares, houve ênfase na i) legitimidade passiva; ii) adequação da ação civil pública; iii) coisa julgada. Como prejudicial de mérito, a União apresentou pontos sobre a prescrição. E, no mérito, a União retoma seus principais argumentos, afastando o alegado pelas Rés.

Preliminares

No âmbito das preliminares, a União destacou que parte da matéria alegada já havia sido apreciada, motivo pelo qual a parte autora apenas reforçou alguns argumentos já contidos no processo.

Legitimidade passiva

Quanto ao polo passivo na ação e a relação entre as holdings estrangeiras e suas subsidiárias nacionais pelas rés, a União sustentou não prosperar a afirmação de que o apontado liame indireto seria juridicamente irrelevante, fazendo referência à própria Lei das S/A (Lei nº 6.404/76, arts. 236 e 243). Da mesma forma, destacou não ser possível afastar a responsabilidade (e, assim, a legitimidade passiva) das líderes nessa relação porque, além de destino último de parte substancial dos lucros da atividade, são elas corresponsáveis – senão as maiores responsáveis – pela disseminação, inclusive no Brasil, de temas publicitários mundiais para propagação de suas respectivas marcas, com nítido propósito de incentivar o consumo, e tudo sem esclarecer, verdadeiramente, os males causados pelo cigarro. O argumento de que BAT plc e PMI foram criadas, respectivamente, em 1997 e 1987, em sucessão a holdings anteriores, apenas confirmaria que o que houve foi mera reorganização interna dos grupos econômicos, sendo que a reestruturação empresarial é ato volitivo e potestativo de qualquer empresa, não podendo ser considerada uma causa impeditiva da responsabilização por atos danosos praticados no passado.

Adequação da via eleita

Quanto à alegada inadequação da via eleita, a União reafirma que está perseguindo a recomposição de danos causados ao Sistema Único de Saúde, com a estrita finalidade de recompor o patrimônio abalado do próprio SUS. Ressalta que a lei prevê a Ação Civil Pública como mecanismo de proteção ao patrimônio público, sem fazer qualquer limitação no tocante à forma como esse patrimônio seria lesado, sendo o Sistema Único de Saúde brasileiro um patrimônio público e social da nação. De outro lado, no que toca ao argumento de que o interesse da União seria patrimonial e individual, uma vez que almeja apenas reembolso dos seus aportes financeiros ao SUS, excluindo os aportes feitos por estados e municípios, aponta que isso ocorre porque a população sustenta o Sistema Único de Saúde brasileiro de várias formas, por meio de financiamento da União, dos Estados e Municípios, sendo que todas essas esferas federativas podem contribuir para saldar o passivo advindo do produto das demandadas. Todavia, a União somente detém legitimidade para buscar a reparação da sua quota parte, motivo pelo qual o pedido restou assim limitado.

Coisa julgada

No que tange à alegação de coisa julgada, a União ressaltou que não haveria identidade de partes, de causa de pedir e de pedido entre as ações referidas pelas Rés em suas defesas. Aponta, nesse sentido, que os danos morais tratados na presente lide, e sobre o qual é feito o pedido reparatório, não são os danos sofridos por fumantes ativos e passivos, como endereçado na ação do MPSP invocada e sim aqueles danos que afetaram o Sistema Único de Saúde, importando no direcionamento de recursos para o tratamento das doenças causadas pelo produto produzido pelas rés. Desse modo, apesar de fumantes ativos e passivos serem parte das pessoas afetadas por esse dano, quem está sendo aqui substituída é toda a população brasileira, que tem que arcar com a externalidade negativa advinda do produto das rés. Em outras palavras, não há identidade entre os substituídos, dado que a presente demanda se propõe a defender os interesses de um grupo muito mais abrangente (interesses difusos) do que a promovida pelo MPSP e transitada em julgado.

Da mesma forma, quanto à suposta identidade de causa de pedir, destacou a União ser preciso reconhecer que as complexas fundamentações apresentadas como causas de pedir em ambas as ações, com diversos enfoques jurídicos envolvendo uma série de fatos e dispositivos de direito material, dificilmente permitem uma conclusão simplista e imediata sobre identidade entre as causae petendi, tomando-se apenas como exemplo a questão do direcionamento específico a determinadas doenças e o estabelecimento do nexo causal com auxílio da epidemiologia, bem como a própria descrição pormenorizada de condutas das demandadas que, no desenvolvimento de sua atividade, apontam para um cristalino abuso de direito.

Por fim, a inexistência de mesmo pedido restaria cristalina examinando–se os termos do pedido da ação ajuizada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, na parte em que mencionado o dano moral, pois lá o requerido é o dano sofrido por fumantes, ativos e passivos, bem como seus familiares e dependentes. Tanto isso é fato que a própria execução de tal julgado ficaria ao cargo desses, individualmente, nos termos do art. 97 do Código de Defesa do Consumidor. Ou seja, de forma muito clara, o pedido foi feito em nome desse delimitado grupo de pessoas. Na presente ação, todavia, se estaria diante de uma demanda difusa.

Prescrição

Quanto à indicada prescrição apontada pelas Rés nas contestações, sustentou a União que inexiste relevante discussão sobre o termo inicial da prescrição no que toca a responsabilidade civil. A pretensão ressarcitória somente surge com a constatação do dano e a aferição de sua extensão, como se nota da jurisprudência sedimentada tanto no STJ, como no TRF da 4ª Região. Outro ponto pacífico que merece destaque é que a prescrição é instituto de direito material, parte do mérito da demanda. Assim o sendo, deve se comportar de acordo com as peculiaridades de cada situação de direito material que lhe dá substrato, levando em consideração a forma como as lesões ocorrem, se atingem direitos fundamentais indisponíveis, ou ainda se ensejam tutela jurisdicional coletiva, como por exemplo o direito ao meio ambiente, à saúde e à vida. Ou seja, a prescrição possui íntima relação com o direito pleiteado, influenciando esse e sendo por esse influenciada, como também é entendimento do STJ e do próprio STF. O terceiro ponto provém da constatação de que um dano pode se originar de múltiplas e diárias razões e se converter, para um terceiro, numa lesão constante, de forma continuada. Essa é justamente a peculiaridade aqui tratada. A União registra, com destaque, que ao contrário do que alegam as demandadas, jamais a inicial caracterizou o prejuízo noticiado nos autos como um único evento danoso prolongado no tempo. De modo expresso a petição inicial afirmou que o dano a ser reparado por meio desta demanda corresponde às despesas havidas pela sociedade, no âmbito do SUS, para constantemente custear “milhares de medicamentos, procedimentos e tecnologias médicas empreendidas no tratamento de doenças atribuíveis ao tabaco”. As demandadas buscam confundir o dano em si com a forma como o dano repercute para a sociedade.

Mérito

Em relação aos demais argumentos trazidos pelas rés, em réplica a União reafirma a inadequação de todos eles, repisando alegações já trazidas em suas manifestações anteriores. Quanto ao argumento da suposta insuficiência da CQCT como causa de pedir, diante do que já afirmado por diversas Cortes internacionais, alega que a CQCT constitui, sim, fonte de direito internacional cogente. No aspecto do dano, reitera a presença de dano indenizável na presente ação, com os exigidos requisitos da certeza e imediatidade, propondo novamente que seja utilizada a teoria do market share;

Quanto à alegação das rés de impossibilidade de liquidação dos pedidos formulados, reafirma disposições legais que possibilitam e amparam o pedido da União, bem como reitera termos do parecer do Prof. Cassio Scarpinella Bueno nesse sentido. Em conclusão, aduz a importância do saneamento do feito para a produção de provas outras além das documentais já produzidas e, para tanto, sugere a realização de audiência de saneamento do processo, tal como preconizado no art. 357, § 3º do CPC.

PETIÇÃO DA SOUZA CRUZ SOBRE A RÉPLICA DA UNIÃO

26 de agosto de 2022

(Parte 39) (Evento 105) (Pág. 132)

A ré, Souza Cruz, apresentou manifestação à Réplica, reforçando alguns argumentos já contidos no processo.

Alegou a Souza cruz que:

✔︎ A União silenciou acerca de

i) documentos e argumentos a respeito da ausência de qualquer conduta antijurídica;

ii) interrupção do nexo causal pacificamente reconhecida pela jurisprudência dos Tribunais pátrios;

iii) diversos outros fundamentos que seriam, em sua avaliação, suficientes para justificar a extinção do presente processo.

✔︎ Corroborou o argumento de que a União atua em nome próprio na demanda e que a ACP teria por objeto suposto decréscimo patrimonial que a União afirma ter sofrido em razão do cumprimento de seu dever legal de financiamento do SUS. Não haveria, assim, tutela de direito da coletividade. O fato de se discutir eventual ressarcimento aos cofres públicos teria, no máximo, o condão de impactar indiretamente a população. E, neste ponto, não seria possível a cumulação de pedidos – danos materiais à União e morais à coletividade -, porque se trata de pedidos heterogêneos e sem compatibilidade procedimental.

✔︎ Segundo a Souza Cruz, a União buscaria o melhor de dois cenários, inconciliáveis entre si: que a demanda seja sobre indivíduos e seus respectivos tratamentos, para justificar por que a pretensão não prescreveu, e, ao mesmo tempo, que a demanda não tenha qualquer relação com a situação dos fumantes individualmente considerados, na tentativa de se esquivar de suas obrigações de provar que os fumantes começaram e continuaram fumando em razão de alguma conduta antijurídica da Souza Cruz e que  esta suposta conduta antijurídica foi a causa direta e imediata das doenças dos fumantes tratados pelo SUS.

✔︎ Não haveria, pela União, demonstração de qualquer conduta antijurídica que tenha resultado em gastos mais elevados pelo SUS. A Souza Cruz não teria cometido ou comete qualquer ato ilícito ou exercício abusivo de direito e, tampouco, desempenha atividade de risco e seus produtos não são defeituosos (são de periculosidade inerente). Não teria sido demonstrado o nexo de causalidade entre as alegadas condutas antijurídicas e o início e continuidade do consumo de cigarros pelos usuários do SUS, e muito menos teria sido comprovada a existência de dano indenizável à União em decorrência do nexo de causalidade alegado.

✔︎ Além disso, a Souza Cruz reforçou o argumento sobre a impossibilidade de postergar a aferição do an debeatur para liquidação. A União pretenderia postergar a comprovação da existência do dano e do nexo causal para fase de liquidação; no entanto, o viés coletivo não dispensaria a aferição individual e heterogênea dos danos alegados e de sua causalidade, o que seria incabível em ACP. Uma sentença genérica pretendida pela União não se coadunaria com o sistema processual brasileiro, seja em ações individuais, seja em demandas coletivas.

✔︎ A Souza Cruz reforçou argumentos sobre coisa julgada, prescrição e que afastariam a Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco (“CQCT”) como fundamento legítimo a ação. Repisou, ainda, argumentos sobre a diferença de casos estrangeiros de responsabilidade das fabricantes de tabaco, envolvendo diferentes fatos, leis e sistemas jurídicos não têm influência na resolução do caso em exame. Repetiu argumentos sobre o mercado ilegal de tabaco, sobre a pretensão de ressarcimento de danos hipotéticos, sobre a distinção entre atividade de risco e produto de risco, dentre outros elementos já levantados na defesa.

Acompanham a manifestação da Souza Cruz novos pareces, sendo autores: Judith Martins-Costa, Carmen Tiburcio, Anderson Schreiber, Luiz Rodrigues Wambier, Gesner Oliveira, Denizar Vianna, Luiz Pontel de Souza, Leonardo Florencio Samuel Aguirre e Maria Melonia Meschi.

PETIÇÃO PMB LTDA E PMB S.A. SOBRE A RÉPLICA DA UNIÃO

26 de agosto de 2022

(Parte 53) (Evento 108) (Pág. 397)

A PMB Ltda. e PMB S/A manifestam-se sobre a réplica da União e sobre a manifestação da Associação de Controle do Tabagismo, Promoção da Saúde e dos Direitos Humanos – ACT Promoção da Saúde e sobre pareceres jurídicos que a instruem.

Corroboraram argumentos já levados em defesa, apontando inverdades e argumentação vacilante por parte da União, afronta à jurisprudência consolidada sobre a matéria no Brasil e violação do princípios nemo potest venire contra factum proprium por parte da União.

Repisaram os argumentos sobre a inadequação da via eleita, a impossibilidade de se cumular pedido individual e difuso, a prescrição, a inexistência de danos renováveis, a inaplicabilidade da CQCT para fundamentar a pretensão da União. 

Reforçaram o argumento de que a União busca burlar ao princípio da legalidade com a criação de obrigação pecuniária com as mesmas características de um tributo e que as “externalidades negativas” não constituem nem ato ilícito nem dano a desencadear responsabilidade civil.

Juntam parecer de Tercio Sampaio Ferraz Júnior e Logos Consultoria.

Em sua conclusão, após um longo arrazoado, as rés requerem o julgamento antecipado de improcedência (art. 355 do CPC) da presente ação, em razão

(i)  da afronta à jurisprudência consolidada sobre a matéria;

(ii)  da violação ao princípio do nemo potest venire contra factum proprium;

(iii)  da tentativa indevida de tributação inconstitucional por vias transversas, somada à ausência de autorização legal para o pedido de reembolso;

(iv)  da falta de demonstração de qualquer tipo de nexo de causalidade, e a impossibilidade de usar a epidemiologia para tanto;

(v) da inexistência de qualquer tipo de dano indenizável, mesmo em tese. Caso não seja esse o entendimento do juízo, requerem a imediata extinção da ação com resolução de mérito pela prescrição, tanto sob a perspectiva da responsabilidade subjetiva, quanto da responsabilidade objetiva (arts. 354 e 487, II do CPC).

Em último caso, requerem a extinção da ação sem resolução de mérito (art. 354 do CPC) seja pela inépcia da inicial, que cumulou pedidos incompatíveis entre si (arts. 330, I e §1º, IV e 485, I do CPC); seja pela falta de interesse de agir da Autora na modalidade adequação em relação ao pedido de reembolso de despesas médicas (art. 485, VI do CPC). Na hipótese do juízo entender pela necessidade de dilação probatória, requerem o deferimento das provas indicadas. 

Confeccionam tabela com fatos relevantes os quais, no seu entender, “provam que o Estado brasileiro tem ciência de longa data sobre os riscos associados ao cigarro”.

PETIÇÃO PMI SOBRE A RÉPLICA DA UNIÃO

26 de agosto de 2022

(Parte 53) (Evento 109)

A PMI apresentou TRÉPLICA à réplica da União, reproduzindo argumentos já manifestados, bem como tecendo considerações sobre os pareceres apresentados pela ACT PROMOÇÃO DA SAÚDE, admitida como amicus curiae.

Após fazer uma introdução sobre a demanda, a ré retomou argumentos já aduzidos, à exaustão, acerca das alegadas preliminares. Apontou a fraqueza do argumento de que a globalização justifica o exercício da jurisdição brasileira e que a PMI não interfere no dia a dia da PMB Ltda. e da PMB S/A. Questionou, também, os precedentes internacionais invocados pela parte autora e o argumento da União sobre a desconsideração de personalidade jurídica.

Dentre as razões da devida extinção imediata do processo, PMI destacou que a União teria alterado a causa de pedir na réplica, deixando claro que o procedimento de ação civil pública não é adequado para os seus pedidos. Além disso, a extinção do processo seria necessária diante da prescrição de seus pedidos e de diversos dos argumentos (fáticos e jurídicos) trazidos com as contestações que não teriam sido objeto de atenção da União.

Sobre a dilação probatória, não haveria, no entendimento da PMI, razão na continuidade de uma discussão sobre epidemiologia, considerando que o STJ já decidiu, em diversas ocasiões, que o uso de estatísticas envolvendo ações indenizatórias relacionadas ao consumo de cigarros não atende o requisito legal de causalidade direta e imediata e que o livre-arbítrio dos fumantes interrompe o nexo causal. Similarmente, não haveria razão para a discussão sobre os “consensos científicos” sobre os quais foi formulada a CQCT, na medida em que tal convenção, conforme apontado detalhadamente em contestação, não serviria de fundamento à causa de pedir da União segundo o direito brasileiro e tampouco justifica a procedência da ação.

Em conclusão, reafirmou a inexistência de jurisdição brasileira sobre a PMI neste caso.  Se ultrapassada essa discussão, PMI requereu o julgamento antecipado do processo para que seja extinto, seja sem (art. 354 do CPC) ou com resolução de mérito (arts. 355, I e 356 do CPC). Não prosseguindo o processo nas formas requeridas, reserva-se o direito de, oportunamente, uma vez realizado o saneamento, especificar outras provas para demonstrar a improcedência dos pedidos da União.

outos tópicos do resumo do processo

AS RÉS

As rés do processo são: SOUZA CRUZ LTDA.; BRITISH AMERICAN TOBACCO PLC, pessoa jurídica estrangeira, controladora da empresa SOUZA CRUZ LTDA.; PHILIP MORRIS BRASIL INDÚSTRIA E COMÉRCIO LTDA.; PHILIP MORRIS BRASIL S.A., pessoa jurídica estrangeira; PHILIP MORRIS INTERNATIONAL, pessoa jurídica estrangeira, controladora das empresas PHILIP MORRIS BRASIL INDÚSTRIA E COMÉRCIO LTDA e PHILIP MORRIS BRASIL S.A.

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